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17 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região TRT-2: XXXXX-04.2017.5.02.0019 SP - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

14ª Turma - Cadeira 2

Publicação

Relator

DAVI FURTADO MEIRELLES
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Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO

GABINETE DO DESEMBARGADOR FEDERAL DO TRABALHO DAVI FURTADO MEIRELLES

PROCESSO TRT/SP PJE Nº XXXXX-04.2017.5.02.0019

RECURSO ORDINÁRIO

RECORRENTE: COMERCIAL DE ALIMENTOS SAN PEDRO LTDA - EPP

ADV: BRUNA PEREIRA GUERRA DE SOUZA

RECORRIDO: WILLIAN BORGES COUTO

ADV: LUIZ HENRIQUE DA SILVA COELHO

ORIGEM: 19ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO

JUÍZA SENTENCIANTE: PAULA BECKER MONTIBELLER JOB

EMENTA

Vínculo de emprego. Motorista. O vínculo empregatício configura-se não pelo aspecto formal, mas pela realidade dos fatos, em observância ao princípio da primazia da realidade, que acarreta a descaracterização de uma relação civil de prestação de serviços quando presentes os requisitos da relação de emprego. No depoimento do preposto constata-se a presença de todos os elementos caracterizadores do vínculo empregatício, inclusive a subordinação, haja vista que o reclamante obedecia ordens do encarregado, era obrigado a cumprir o itinerário e os horários pré-determinados pela ré, e atuava como motorista em atividade diretamente ligada ao objeto social da empresa. Recurso Ordinário patronal não provido.

RELATÓRIO

Inconformada com a sentença de fls. 342/351, que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados, recorre a reclamada, discordando do vínculo empregatício reconhecido em primeiro grau e verbas rescisórias daí consequentes, especialmente férias, FGTS e multa do art. 477 da CLT, insurgindo-se também no tocante às horas extras, adicional noturno, indenização por aluguel do veículo e auxílio combustível. Por fim, questiona a concessão ao autor dos benefícios da Justiça Gratuita.

Contrarrazões do reclamante.

Autos sem manifestação do Ministério Público do Trabalho.

É o relatório.

V O T O

Conheço do recurso, por preenchidos os pressupostos legais de admissibilidade.

MÉRITO

Recurso da parte

1. Vínculo de emprego. Horas extras. Adicional noturno

Sustenta a reclamada, em apertada síntese, contra o vínculo empregatício reconhecido na origem, que a prestação de serviços do demandante se deu sob a forma de parceria, independentemente de qualquer subordinação ou dependência econômica, protestando pela validade do contrato de frete entabulado entre as partes, atuando a prova dos autos em abono de sua tese.

Argumenta que o autor laborava quando tinha interesse e disponibilidade, no horário que lhe fosse mais conveniente, inclusive para terceiros, sem qualquer fiscalização de horários ou ingerência da recorrente.

O inconformismo não merece acolhida.

Registre-se, inicialmente, que o vínculo empregatício configura-se não pelo aspecto formal, mas pela realidade dos fatos, em observância ao princípio da primazia da realidade, que acarreta a descaracterização de uma relação civil de prestação de serviços, quando presentes os requisitos da relação de emprego.

Pois bem. Uma vez admitida a prestação de serviços, cabia à demandada o ônus de comprovar a alegada relação de autonomia e eventualidade nos serviços prestados pelo autor, eis que fato modificativo do direito postulado (arts. 818 da CLT e 373, inciso II, do novo CPC). Contudo, deste encargo não se desonerou a contento.

Na verdade, a tese patronal restou fragilizada no depoimento do próprio preposto, que afirmou que o reclamante cumpria roteiro de entregas elaborado pela própria reclamada, sendo ele próprio que coordenava as entregas do reclamante, evidenciando-se assim a existência de subordinação jurídica.

Acrescentou ainda que o reclamante tinha que chegar entre 4h00 e 7h00 da manhã para carregar (dando conta da existência de horário determinado), efetuando todas as entregas de mercadorias do dia, munido de vestimenta (uniforme) da empresa, que o veículo era rastreado pela ré, e que o reclamante somente poderia se fazer substituir "mediante autorização expressa da reclamada" (pessoalidade).

Além disso, foi devidamente comprovado o requisito da onerosidade, havendo contraprestação pelos serviços prestados em favor da reclamada, relevando notar que tal prestação era contínua e ininterrupta (não-eventualidade), tendo o autor se ativado por quase quatro anos, de forma exclusiva, não trabalhando para terceiros.

Não discrepam os depoimentos das testemunhas, que confirmaram que era o Sr. Rubens (preposto da ré), quem definia o itinerário das entregas e coordenava os trabalhos, além de Vinícius e João, tais como chegar no horário, andar com uniforme da empresa, seguir itinerário, não levar caroneiro e retornar no final do dia à sede da empresa e lavar o carro.

Concordo com a avaliação do magistrado 'a quo' no tocante ao depoimento da testemunha trazida a convite do demandante, Sr. Rogério, vez que seu depoimento, em outros autos, como demandante, não desvirtuou as informações trazidas neste feito.

In casu a alegada eventualidade/autonomia da prestação dos serviços foi afastada pelo preposto, que reconheceu o labor todos os dias na época, além de admitir sua ativação por extenso interregno (quase quatro anos).

O fato de atribuir-se à relação jurídica o nomen juris de trabalho autônomo, ou eventual, não impede o reconhecimento do vínculo empregatício. O autor prestou serviços ligados diretamente à atividade essencial do empreendimento, não sendo possível a transferência dos riscos inerentes do negócio ao trabalhador. Assim, não pode a ré utilizar-se de pseudo trabalhador autônomo para a consecução de seu objetivo social, pois tal conduta acarreta a transferência ilícita dos riscos de sua atividade econômica, caracterizando fraude à legislação trabalhista.

Nos termos do entendimento cristalizado na Súmula nº 212 do TST, era da reclamada o ônus de demonstrar o término do contrato por vontade do trabalhador, tendo em vista o princípio da continuidade da relação de emprego. Tendo em vista que a defesa foi genérica, com fulcro na existência de uma relação comercial de prestação de serviços, as verbas rescisórias, férias, FGTS e multa do art. 477 da CLT são procedentes.

Com relação à duração do trabalho, insurgindo-se a parte contra o deferimento de horas extras, inclusive noturnas, justificando que o recorrido não comprovou as assertivas dispostas na peça de ingresso, alegando ainda o exercício de jornada externa, é certo que não basta o trabalho ser externo, sendo necessário que não haja possibilidade de controle da jornada, e que tal condição seja anotada na carteira de trabalho do empregado, condições cumulativas a serem observadas.

O trabalhador que é obrigado a comparecer na sede da empresa ou em qualquer outro local por ela designado, no início ou no término da jornada de trabalho, não está incluído nesta exceção. Também não pode se incluir no inciso I do art. 62 da CLT, o trabalhador que, a despeito de desenvolver atividade externa, tem sua jornada controlada por qualquer meio, hipótese dos autos.

Em resumo, tem-se que a prova oral colhida nos autos atua em favor do reclamante, devendo prevalecer a jornada de trabalho descrita na inicial também porque ausente o controle de jornada dos autos, entendimento consubstanciado no Verbete nº 338 do TST.

Nada a reparar.

2. Aluguel de veículo. Indenização

Contra a sentença que condenou a recorrente ao pagamento de indenização pelo aluguel do veículo do autor no importe de R$ 2.040,00 (dois mil e quarenta reais) mensais, recorre a parte, argumentando que o contrato de frete já absorvia tais despesas.

Não prospera.

Incontroversa a utilização de veículo do próprio obreiro para o desempenho das atividades, incontestável sua depreciação e necessidade de manutenção ao longo do tempo, ainda que não tenha havido ajuste entre as partes com respeito ao valor pela utilização mensal do veículo, sendo certo que a reclamada não impugnou o valor mencionado na exordial.

Mantenho.

3. Auxílio combustível

De igual forma, além da utilização do veículo próprio do obreiro, ficou patente a despesa com combustível correndo por sua conta (R$ 1.600,00 por mês), sem qualquer reembolso a tal título pela reclamada, sendo certo que esta igualmente não impugnou o valor mencionado na inicial.

Mantenho.

4. Justiça gratuita. Honorários advocatícios

Para a concessão dos benefícios da justiça gratuita, basta a afirmação do empregado, inclusive por intermédio do seu procurador, de que não pode demandar sem prejuízo de seu sustento, não sendo necessária a assistência sindical. Além disso, o art. 790 da CLT permite ao juiz concedê-la de ofício. Registro que a reclamação trabalhista foi ajuizada antes da denominada lei da reforma trabalhista, que começou a viger em 11/11/2017.

Além disso, não é o valor do salário que o reclamante recebia que determina seu estado de pobreza, e sim sua situação atual, sendo presumível a insuficiência de meios, materiais e processuais, em favor do hipossuficiente.

Assim sendo, e diante das alegações do próprio reclamante, juntadas às fls. 13, restam atendidos os requisitos do art. 790, § 3º, da CLT, razão pela qual mantenho a decisão de 1ª instância que concedeu ao autor os benefícios da gratuidade. Ademais falece interesse processual à recorrente em impugnar os benefícios da Justiça Gratuita. Registre-se, por fim, que não houve concessão de honorários advocatícios a qualquer das partes, prejudicada menção quanto ao tema.

Mantenho.

Item de recurso

Conclusão do recurso

ACÓRDÃO

Cabeçalho do acórdão

Acórdão

Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Desembargador FERNANDO ÁLVARO PINHEIRO.

Tomaram parte do julgamento os Exmos. Srs. Magistrados: DAVI FURTADO MEIRELLES, FRANCISCO FERREIRA JORGE NETO e RAQUEL GABBAI DE OLIVEIRA.

Relator: o Exmo. Sr. Desembargador DAVI FURTADO MEIRELLES.

Revisor: o Exmo. Sr. Desembargador FRANCISCO FERREIRA JORGE NETO.

Pelo exposto, ACORDAM os Magistrados da 14ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em: por unanimidade de votos, NEGAR PROVIMENTO ao recurso ordinário da reclamada nos termos da fundamentação supra.

ASSINATURA

DAVI FURTADO MEIRELLES

Desembargador Relator

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VOTOS

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